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Interatividade ou Pseudo-Interatividade

Janice Caiafa
Professora do Departamento de Teoria da Comunicação-ECO

“Muito apressadamente a interatividade é colocada como solução para todos os problemas, é uma espécie de panacéia. Entre nós, o programa Você Decide, da Rede Globo, foi pioneiro nessa questão da interatividade. Supostamente o espectador era convidado a escolher o final que mais lhe agradava. Ostensivamente a televisão mostrava essa chance, que ela oferecia ao telespectador. Agora, o que se descobre com esse programa, que já entrou em extinção, e com outras iniciativas da televisão em se abrir ao telespectador, deixando que ele decida algo, é que de fato não se decide nada. Você não decide nada quando entra no esquema da Rede Globo, por exemplo. De fato, quando perguntam alguma coisa a você, sua resposta já esta prevista. Uma maneira de decidir alguma coisa seria furar esse esquema, fugir dessas questões e colocar uma outra.

Essas oportunidades de interação não são uma verdadeira interação. Os dados já estão lançados, não há muito o que acrescentar, não há uma verdadeira interferência, a rigor, não é realmente uma interação, porque é um esquema montado. Falo na Rede Globo, porque citei esse programa, mas poderia falar nela como um dos lugares mais fechados, onde em nome de imperativos comerciais existe uma estrutura já dada, em que todos nós temos que nos encaixar.

Não há interação quando o esquema é tão apertado e as coisas já estão dadas. Você acaba decidindo, mas o que decide é de fato uma bobagem, que não interfere em nada. Mais vale o silêncio nesses momentos. Existe uma potência muito forte no silêncio. Nós somos chamados a opinar sobre tudo, somos convocados a dizer o melhor final para a novela. Essa loquacidade tantas vezes vazia, nos impede de pensar algo interessante. Por vezes uma estratégia interessante é se calar.

O filósofo Gilles Deleuse diz uma coisa muito interessante: os verdadeiros clientes da televisão são os anunciantes, não somos nós. É uma ilusão pensar que estamos sendo atendidos por ela. Não que tenha que ser assim, mas a televisão tem sido assim. Acredito ser mais interessante não participar disso e trabalhar em prol de uma outra maneira de fazer televisão.

Os reality shows são programas muito apoiados na interatividade e também numa abertura da intimidade. É um fenômeno que tem adquirido muito poder entre nós. O apelo da interatividade tem um funcionamento reacionário. O que se observa nesses programas é que nada é deixado ao léu e existe um desejo dos organizadores de fazer crer que estamos observando um cotidiano completamente descomprometido. Não é assim. Aquelas pessoas estão contratadas por certos aspectos que elas guardam e estão ligadas a certos objetivos comerciais. O que se atualiza ali é uma cena tão artificial como qualquer outra. Ao mesmo tempo é um cotidiano muito pobre de subjetividades.

Um dos pontos em que se diz que a TV digital traria maior investimento é na interatividade. Essa interatividade só valeria a pena se nos levasse realmente a interferir. Não se for uma interatividade de venda, como já existe nos projetos de TV digital. Poder olhar um produto que eu gostei numa novela, apertar um botão e comprar. Essa interatividade só interessa aos empresários de mídia. Às pessoas, só interessa uma interatividade em que elas possam interferir, pensar alguma coisa, agir, uma interatividade de fato ativa "

Fonte: Olhar Virtual

Ossoba Studio

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